22.11.11

não há nada no mundo que me pertença
nem nada mais que eu seja
seja sendo ou seja
adjacente

6.10.11

Queda

Ainda que de cabeça-para-baixo, caímos em queda-livre.

Livres.

23.9.11

que a gana de escrever persista, visto que a abstinência cansa os discos do meu hd. troquei as cordas, os móveis, pendurei um quadro, pra descobrir que não dá pra se enxergar na borra-de-café sem provar desse gosto amargo que cada um tem, e que essa mania de ser invencível não anestesia certas dores porque dores certas não existem.

6.4.11

a nossa cova ardia
a tua covardia
à minha cor vadia

3.3.11

Solmbra

No vale, vuelve pronto, os hermanos voltaram para os bons ares e as ruas têm amolecido com as putas da av. do Estado. Nada como o caos, as casas de rock e a vodca da geladeira. Até os travestis que passam pela minha cortina entreaberta. Me vi pertencendo à isso tudo, pela primeira vez. Na quadra seguinte os calcanhares sorriram, vendo as marcas deixadas na praia. Da barra ao pontal a luz maior acompanhava, corria por entre as nuvens e os prédios, fugia e vinha se esconder nas páginas como sombra sol sombra sol sombra sol sombra sol.

26.1.11

pé sobre pé



névoa
voa
nuvem
escura
lua
luz
cores
cura


24.12.10

um gaudério sentou ao meu lado naquele boteco da esquina e - entre as filosofias e citações de Raul - bateu o copo na mesa, empurrou a cadeira amarela para trás, ergueu o punho em que a espuma gelada escorria, encarou as gotas, as outras, e disse, num tom alcoólatra com piegas:
"eu sou uma corda, você decide se faz um laço ou uma forca".

16.12.10

- Pois não?
- Uma passagem só de ida para a Terra do Nunca, por favor.
- Certo. Para quando, Senhora?
- Ontem.
- É só escolher a poltrona, Senhora.
- Só tem no corredor?
- Para voar não aconselhamos janelas. E pra voltar no tempo tem que ser correndo, Senhora.
- Certo. Me vê essa daqui sem nenhum encosto, então.
- Certo. Boa viagem, Senhora.
- Mas e o horário?
- No tempo a gente não decide, é assim, Sem hora.

20.10.10

ele que foi sempre tão atemporal, me veio ainda de manhã com uma de "antes de mais nada..." terminando com um "e depois de tudo..." se recalque ou saudade, pra mim tanto faz, pois no telefone fixo aquelas reticências que corriam desgovernadas do passado da sua boca só encontraram meus nunca-tão-fixos pontos finais - colocados entre um ou dois bocejos: "já é primavera e eu ando tão colorida quanto".

4.10.10

aquela procrastinação cibernética não me distraía mais desde certa madrugada e o placebo da vez tornaram-se as tardes com livros e sucos-de-todas-as-frutas-do-cardápio na mesa dos bancos altos. 3.50 num bolso, cigarro no outro, e o caderno de poemas disfarçadamente nas mãos. sentava na calçada arrancando e picotando os papéis, já que sabia não ter nada de interessante dentro de casa. sob a recém primavera chuvosa, os úmidos pedaços fugiam com o vento. o meu guarda-chuva não abre só para um e ainda não deu tempo das árvores florescerem, portanto, desprotegidos chão e pés, poças iam virando rios e eu lembrava que entra água na minha alpargata velha. à efeito do caos, pensei ter visto chama ou até verão quando uma luz forte a la cem graus celsius me atingiu, mas era estrela-cadente que descia correndo - como se para me entregar, urgentemente, a resposta que precisava. a roupa molhada me arranjava um resfriado. um som no fone direito e outro no esquerdo disputavam aos berros os meus tímpanos (trovoadas com gosto de maçã com casca). os papéis caíam, os papéis partiam. os papéis se invertem. e eu não vejo a hora dessa estrela-cadente aterrissar.

28.9.10

;

Certa vez, caminhando sobre os rodapés de uma página qualquer, li uma certa mulher que, na prateleira, me chamou a atenção. Instigava-me o seu título, suas letras cuidadosamente aplicadas as quais eu precisava desvendar em palavras e frases. Tinha orelhas enfeitadas com vírgulas - que recebera no natal de algum parênteses - e números impressos em rugas nos cantos dos olhos. Pontos finais lhe cobriam o rosto e o corpo, como pintas; hífens e travessões, como cílios. Usava uma linha envolvendo o dedo, feito aliança, mas, fitando-a, vi cair de seus olhos reticências que transpareceram certo âmago em tirá-la e colocar no pescoço (alimentando ou cessando a loucura do enredo). "Ninguém determina o que acontece quando acaba a introdução. Sua fisionomia perfeita, morfologia desfeita, interferem na noite e na fonte, nada mais." - e eu só queria ter aberto aquele conto antes para tirar uma caneta e alertá-la do futuro desafio. Desenvolvimento, enredo; este traçava-se nas manhãs em que, pendurada em aspas, ela indireitava o topete das interrogações e as transformava em exclamações. No entanto, naquela tarde, naquele capítulo, havia despencado em itálico em um dos "!" e o rompido, formando um ponto-e-vírgula: nunca antes deparado e que nem dois pontos puderam disfarçar. O clímax me confundia e eu já não sabia se observava a escritora ou a protagonista, cada vez mais consumida por uma aparente fobia literária do inóspito, que a impedia de continuar. Seus registros (sempre passagens, poemas curtos, frases de efeito) agora enfrentavam o meio-termo resultante à queda, aquela tal pontuação e tudo aquilo que representa: o ad infinitum entre o que continua e o que termina. o maldito... não soube lidar. E então parou (já que parágrafo não) frente ao ponto sob vírgula, atrás de letras maiúsculas de decepção e sob seu complexo em negrito. Colocou o chapéu circunflexo sobre o cabelo til e partiu. Afogada em nanquim, se despediu com uma assinatura na contra-capa e uma (sua) história sem fim.

17.9.10

des-maio

de gota em gota o meio-vazio se transforma em meio-cheio. transborda o meio-termo. de vírgula em vírgula encontram-se os pontos de vista. o colírio da compreensão. escorrem pela catarata - de água, dos olhos e das águas que caem dos olhos - e a íris, de pingo em pingo, preenche os ís dos 'impulsos' de maio. incompletos ainda os de 'ınfinito' e 'ıntenso' que, com a gravidade, me fogem da mão. des-maio e os pingos continuam no chão.

22.8.10


o teu silêncio não tava nada quieto e gritou um sussurro de contradições quando eu ouvi da tua voz a inconstância de 'procurar os sapatos ou um caminho com menos espinhos?' e, querida, isso tá me deixando nervosa tá me pesando aqui no peito e tive até um pesadelo - não me pede pra entender isso que disso daí eu não entendo e eu também prometo não vou pedir pra você explicar, só tenta fazer como eu e tira esse sapato apertado e tira esse aperto de cima e cuidado pra não pisar ali embaixo. voa e me deixa voar que é o resto não-resto que sobra, e só não vai me dizer que tá cansada disso porque, poxa, de distância física a gente já tá saturada mas de voar você sabe que eu não me canso. aí não é como aqui não tem sempre vento-sul então não desperdiça a brisa quando bater na sacada e aproveita pra vir com ela antes que chegue furacão. e lá de cima quando olhar o mar e se ver por inteiro, e, se me vir por dentro, lembra de fevereiro e faz como no verão voa mais alto evapora comigo como quando a gente suava e se sujava e fazia checks em cada lugar maluco que a gente fez amor e é, vem amor vem voar comigo não larga a minha mão e deixa que dos tantos empecilhos até o 'mãe' a gente superou, não vai criar mais um, hein, não vai esquecer de pedir uma mesa-para-dois e não me faça ser discreta. não me deixa levitar sozinha nem desperdiça essas asas bonitas.. enrosca nas minhas, vai, voa comigo.

23.7.10

meu plano de tentar-não-postar-somente-textos-dela funcionou bem durante um mês, mas a gaveta aqui do criado-mudo já tá cheia de papéis e a lista de postagens tá transbordando rascunhos. pra falar a verdade, na mais aleatória das prosas ou poesias que escrevi aqui, era nela em quem eu pensava nos espaços brancos entre as linhas.

20.7.10

sinfonia dos lençóis

cada aperto uma nota,
cada gemido uma pausa




até alcançarmos o silêncio.

11.7.10

o chapéu de palha rodava através das cabeças, dos olhares em transe ao observarem pôr-do-sol, ao inspirarem outra palha, do cigarro que também rodava, e nos mergulhava em conjunto no próprio destino, em carrosséis desgovernados, sob segundos eternizados. rodavam-os, rodávamos.




4.7.10

o tal espelho que te negou reflexo queria ser aquela janela que emite luz sem rumo nem nexo

selos, seios e anseios

cartas, cama e venenos.

2.7.10

(alie)nação

ponto holandês. pronto.
pôs fim à esperança, superânsia, superação
de um país patriota de quatro em quatro anos,
de povo mudo e de muito copo, copa do mundo.
ah, os anos de eleição...

anos dos botões das urnas empoeirados
e os de controle remoto apertados. quebrados.
troca-se pilhas, as recarrega, renova.
e a mente continua a mesma:
profana, aguada, rala, aquosa.


1.6.10

morte de marte, vinda de vênus

ele
reclamou das minhas pernas inquietas, tocou-as, com 0,3% de objetividade de fazê-las pararem. tocou-as. quietas, reclamou da quietude, transformou sossego em monotonia. irritou-se ao me ouvir dizer da barba que me arranhava; jogou os barbeadores fora. mudou o canal da televisão, deitou no meu lado da cama (ele sabia que aquele foi sempre o meu lado), puxou as cobertas durante a noite. não veio à noite. sumiu.
ela
riu dos meus joelhos tortos, acariciou-os, encostou aos seus. 0,0% de força que os machucassem. encostou-os. juntos, agradeceu por aquecê-la, transformou o torto em encaixe. envergonhou-se ao ouvir sobre seus olhos anil. me prendeu quando roubei um beijo dos seus lábios descansados; acordou-os. pegou em minha mão, me levou para longe, me fez querer ter uma máquina do tempo. sumiu.

17.5.10

Macio como terra, forte como aço.


Tudo resume-se a um terraço. Desde o começo (precedente à subida) era a magia do inexplorado, perigoso, da vontade, ou uma personificação do alcance que desejávamos. Saí de portas antigas, para entrar em outras, e subi os primeiros andares, ainda só. Primeiro, segundo, até que parei. A encontrei, me encontrando em um quarto, que encontrava paredes. E ali fiquei - por pouco tempo, logo decidindo subir, ir além. Atravessaram tabus, portas, andares, quarto(s), quinto, sétimo, décimo... Mal lembro quantos foram, apenas sei que não bastaram. Precisaram de novas certezas, novas escadas, externas e verticais, envoltas por ferros frágeis, esguios, gelados. Escorregadios em meus dedos úmidos e nervosos - assim enfrentados. Já era possível sentir a brisa nas canelas, o vento que bagunçava os cabelos e nos arrepiava, forçava-nos a subir. Conforme pisavam, pisoteavam os medos, os ignoravam, degrau por degrau. A vista, ao passo que o futuro, tornava-se real, contemplada, contemplado. Abstraímos o frio, transformando-o em brasa, brasa jamais cinza. Tornou-se preto, uma ausência de luz ainda sim colorida, uma escuridão clara, cintilante, como a imagem da chegada, após todo o esforço: um céu estrelado, áureo e vívido como nunca. "Valeu a pena." - pensou consigo mesma. Ainda haveriam fios e antenas pelo caminho; ainda haveria inveja, preconceito, o drama e a fragilidade de onde estavam, tão próximas do abismo, mas ainda mais perto das estrelas, estas, infinitas. Enquanto os colares se quebram e as flores murcham. Independente do tempo, das mudanças, da distância. Infinitas. E então revelamos o amor, relevamos a dor; ora com as mãos, ora de escada, ora de elevador.

25.4.10

Inércia

O mundo tende ao encaixe - dos continentes, dos astros, dos braços.

15.4.10

Nada colorida

A cicatriz ainda pulsa, inconstante, sem saber se abre ou se sara. Consequência de um caso banal à alvorada, mas inóspito aos dois jovens. A suspeita virou fato, nós negávamos. Nos negávamos. Síndrome gato-e-rato (agora te quero e depois me afasto). Era tudo medo, pois compartilhavam de uma amizade sólida, findada no dia em que ele a quis colorir - dispôs papel, ela os pincéis; as cores viriam com o tempo. Viriam, se em meio às fibras e celulose destas folhas não houvessem marcas de pinturas passadas, demonstrando que sairam junto à outras (folhas, amantes e histórias). As deformações, intercaladas em profundas e supérfluas, desviavam os traços que nos esforçávamos a fazer, e tornou tudo um esboço, sem a beleza esperada. Ele, ao invés de arranjar um novo caderno, ou ao menos um novo papel, continuava a (tentar) conciliar as tantas artes, já abstratas. Deixou até de ser abstrata, de ser obra, nem mais aventura. Era desgaste, sujeira, borrão, e de tanto apagar e passar por cima, rasgou-se. Havia arrependimento na palavra do artista, mas não havia cacife para mudar ali, diante da mínima esperança que restava. Ela então apenas terminou o feito, picotando o que restava. Pensou em queimá-los, no entanto, fez-se sem fósforo, ignorou os isqueiros e as velas e guardou-os para si. Para agora juntá-los aqui.


(dez/2009)

31.1.10

vírgulas dissimuladas

nicotina,
em
meus cabelos
nós,
na cama
nossa,
aventura.